Ficha técnica no IMDb
Sentindo que sua vida está estagnada em todos os aspectos, Jenn busca ajuda na hipnoterapia. Só que acaba envolvida em um jogo psicológico mortal.
Tenho a impressão de que a cena de abertura induz o espectador a achar que o filme é uma variante de Jogos Mortais, graças à sua pouca informação, ao medo e ao desfecho das paredes se aproximando, rumo a um esmagamento. Esse ar brutal é incompatível com a premissa de um “jogo psicológico” e pode guiar a expectativa, atrapalhando a experiência.
Fiquei incomodado com as cenas vergonha-alheia da festa do início do filme, mas achei bom o momento em que a Jennifer impede o Brian de ingerir um alimento pelo risco de uma reação alérgica. É uma forma bem eficiente de demonstrar que ela se importa com ele e já se importou. Havia um clima de briga de ex-casal, mas o roteiro conseguiu inverter a percepção. É o tipo de virada que amplia a minha conexão com a obra.
Com a ligação emocional estabelecida, a conversa sobre o relacionamento e a surpresa com a noite do casal se tornam relevantes e, até certo ponto, interessantes. Há muitos filmes que não conseguem fisgar a minha atenção como Hypnotic conseguiu neste início.
Quando o terapeuta diz que segue as regras 99% das vezes (ou é do tempo), é um comentário válido para a situação e serve como embasamento para a futura reviravolta. Para alguém que não leu a sinopse, deve ser um ponto positivo de destaque.
O local da consulta é exageradamente estranho, suspeito e aquela mulher bizarra torna tudo pior. Não é uma pista sutil, como a referida fala do terapeuta. Além de anular o ponto positivo anterior, tal caracterização me descolou do filme e me desanimou. Senti cheiro de filme que não se leva a sério.
Não que filmes precisem ser sempre sutis, mas ele não escolheu a área cinzenta e partiu para uma caracterização parodiesca estilo Premonição 3. Por outro lado, a morte do filho é um bom motivo para a Jenn fazer hipnoterapia, o que o torna um ponto de virada eficiente.
Durante a consulta, papo vai, papo vem e o terapeuta sugere que a Jennifer convide o Brian para jantar. A lógica de enfrentar o medo é real, mas é evidente que havia um risco muito maior de o encontro piorar as coisas para ela do que de melhorar. Senti que este passo foi um exagero. O primeiro de vários que afligiriam o filme.
Num momento a Jenn está falando no telefone e no outro já acorda com uma sensação ruim. O lapso temporal incomoda e explicita que há algo de errado, mas o uso de uma trilha sonora que parece ser o som de algo atrapalha a compreensão da cena. O espectador pensa que algum movimento será revelado e não é o caso.
A revelação é bombástica, mas não segue do que o som sugeria. Esse conflito de informações é inaceitável. O que fica primeiro é a confusão relacionada ao que houve. O que fica depois é a ruindade da escolha.
A protagonista ter causado uma reação alérgica no Brian é uma boa escolha, pois tem a ver com a cena da festa. Quando uma cena é boa e seu conceito é resgatado posteriormente, ela fica melhor e a do resgate também.
Não sei se ela teve flashes de memória ou se era só para o público, mas o fato é que a Jennifer usa o mágico mundo da internet para pesquisar sobre o terapeuta e problemas causados por hipnose. Ela descobre uma porção de informações relevantes, apresenta-as como evidências de que há algo de errado com o terapeuta e a amiga dela reage como se não fosse nada de mais. É surreal. E não foi dito que ela foi hipnotizada para confiar no terapeuta, então é só uma escorregada do roteiro.
A pesquisa ampla é um bom jeito de jogar a Jenn contra o terapeuta. É uma lógica mais orgânica do que os livros convenientes e as pessoas que sabem de tudo, tradicionais no gênero terror.
O papo bem construído com o detetive faz conexão com a problemática cena inicial e a explica, esclarecendo que o terapeuta matou aquela mulher de medo. Não apaga o defeito do exagero visual, mas é uma boa sacada. Correções racionais nem sempre afetam os desvios emocionais.
O jeito que a Jenn pede uma consulta fora de hora e não justifica bem o pedido de hipnose me incomodou na hora. Era uma grande burrice. Era uma armadilha mais óbvia do que poderia ser, especialmente considerando que o terapeuta é inteligente.
De forma satisfatória, a gravação da sessão revelou que o terapeuta perguntou o que a levou a ir para a consulta e ela disse que foi para gravar e saber o que acontece durante a hipnose. Não tira a irritação pela burrice da protagonista, mas se não acontecesse, seria outra escorregada do roteiro.
Em seguida, a Jennifer nos brinda com mais uma dose de sua burrice. Se ela sabia o risco que o terapeuta representava, por que não falou imediatamente para a amiga que ele descobriu tudo? É um clichê terrível isso de os personagens não serem claros sobre as situações e acabarem falhando na tentativa de evitar o pior. Isso tira o peso de momentos que deveriam ser tensos.
A retomada da aranha como sendo o grande medo da amiga é positiva. O acidente foi inesperado, mas o lado positivo foi se diluindo com a ruim cena da Jenn chegando ao local. Ela é desnecessariamente longa e acompanhada por uma trilha sonora exagerada. O filme exagera recorrentemente nas trilhas sonoras de tensão. Não chegam a estragar o clima, mas cansam.
O não tão brilhante detetive chega ao covil do vilão e aceita um drink. Esse filme é um concurso de burrices ambulante. Por mais que ele quisesse pegar a colher para ter as digitais do terapeuta, havia o risco de acabar dopado. Indo além na estupidez, ele explica ao vilão que percebeu um padrão em suas vítimas. O que ele ganhou com isso? Absolutamente nada. O que ele perdeu com isso? O efeito surpresa. Esse é o pior detetive do mundo.
Eu não sou especialista em hipnose, mas acho que não dá para paralisar alguém surgindo subitamente e dizendo para a pessoa parar. O camarada é um terapeuta ou um X-Men? E ele continua com sua magia.
A Jennifer tem uma sessão de terapia para descobrir o que aconteceu durante as sessões com o vilão, mas ele plantou uma armadilha anti-genjutsu nela e a protagonista acabou presa dentro da própria mente, numa situação que me lembrou o Sylar, de Heroes. Exageraaaado.
De modo extremamente conveniente, a armadilha mental deu à Jennifer pistas para seguir no rastro do terapeuta. Lógico que ela foi sozinha até o casarão no meio do mato e o terapeuta pegou ela lá. Que protagonista mais toupeira.
Citei Heroes porque até o objetivo do terapeuta é parecido com o que aconteceu na série. Ele queria colocar memórias na mente da Jenn e fazê-la ocupar o papel de outra pessoa, que é o que o Matt Parkman tentou fazer com o Sylar. É um objetivo consistente, mas é difícil gostar de Hypnotic com tanta burrice partindo dos personagens principais. Burrice e incompetência.
Uma maluca zumbificada conseguiu pegar o detetive de surpresa e acertá-lo várias vezes. Quando ele descobriu que a pista do consultório foi forjada pelo terapeuta, decidiu ir sozinho ao casarão. O detetive é tão burro que ainda fez barulho quando entrou e alertou o terapeuta.
Se houvesse risco de vida, entenderia a pressa dele, mas ele sabia que o terapeuta provavelmente não pretendia matar a Jenn. Aí o detetive é pego de surpresa, tem dificuldade na luta corporal e a nossa heroína atira nele sem querer. É de fato um concurso de burrice. E o vencedor é o detetive, pois a profissão dele é incompatível com esse grau de burrice e incompetência.
O uso do contra-gatilho é legal, mas não devia ter sido escondido. É um jeito bobo de criar uma reviravolta. Assim Hypnotic mancha o que deveria ser um grande momento. Fico particularmente frustrado com isso, pois gostei muito de sacadas semelhantes em Death Note e em O Caderno do Riso (que algum dia escreverei sobre a parte 2).
O filme usa um recurso de mostrar algo no vídeo enquanto o áudio cobre outro momento cronológico. Algumas vezes é interessante, mas senti que fizeram vezes demais.
No geral, Hypnotic não é um filme ruim, mas é tão irritante pelas burrices dos personagens principais que acaba se sabotando e dificultando avaliações positivas. Ainda assim, é interessante.
Observação: vi muita gente dizendo que o filme é clichê e previsível. Ora, previsível em quê? Em a protagonista e o detetive serem burros? Isso é falha de execução, não um aspecto criativo específico. Em a protagonista ter problemas por ser controlada pelo terapeuta? Mas isso é parte da premissa do filme. O único mistério de Hypnotic é o objetivo do terapeuta e isso é tão pouco relevante e embasado que não faz sentido criticar o filme por ser previsível. Inclusive, criticar genericamente uma obra por ser clichê ou previsível mal faz sentido.