Na noite do Halloween, uma pequena cidade descobrirá que algumas tradições nunca devem ser esquecidas.
Ao longo dos anos, em quase todos os Halloweens, eu assistia a Contos do Dia das Bruxas na TV. Já analisei várias antologias no Blog do Kira, mas, ironicamente, não falei sobre esta, que provavelmente foi a primeira que assisti e uma das melhores. A resenha de hoje tem gostinho de infância para mim.
Segmento inicial
É uma história bem básica. Pelo que entendi, a ideia é que apagar a chama na abóbora permitiu a entrada de uma criatura mística no terreno do casal. Destaque positivo para o sujeito de máscara que parecia ser o verdadeiro terror, mas não era.
Achei meio pobre o desfecho, mas os ataques fantasmagóricos compensam a falta de qualidade do final. Para uma cena inicial, foi boa.
Existe um problema narrativo na primeira história. Como o lado das mulheres fica aparecendo ao longo do lado do homem, o clima acaba sendo parcialmente atrapalhado. Dificulta um pouco a análise e a experiência. Detestei isso.
Pai e filho
Um garoto come doces dados por um estranho e é vitimado por ele. Essa história serve como um alerta, então tem certa função social. O clima dela é mais de humor negro do que de terror, afinal, são feitas várias piadas na parte do enterro do corpo.
O humor não é engraçado, mas o final contém um toque de sagacidade do roteiro e da direção. Como sabemos que o pai é um assassino, quando ele pega a faca, supomos que vá matar o filho.
Eu pensei na possibilidade de ele enfiar a lâmina na abóbora, sendo essa uma quebra de expectativa. Quando a faca foi mostrada suja de sangue, minha teoria se provou errada. A real quebra de expectativa me surpreendeu. Outro motivo para esse efeito é que o conto estabeleceu o filho como uma criança comum e frisou os cortes na abóbora.
Não assusta nem diverte, mas o final é interessante.
O vampiro
Um casal está num momento íntimo num beco ao lado de uma festa e a mulher percebe que está ensanguentada. Achei que o homem fosse mordê-la, mas essa virada foi satisfatória. Apesar de o movimento final dele, lá na festa, ser bobo, a sacada de ela ser ignorada porque outros estão com sangue de mentira no corpo é inteligente.
Segue a estrutura narrativa problemática que mostra várias histórias sem terminá-las. Outro detalhe é que Contos do Dia das Bruxas gosta de mostrar personagens de uma história aparecendo ou sendo referenciados em outra. Nessa, surge o casal da cena inicial. Na da molecada eles mencionam as abóboras que o garoto azarado chutou.
Este trecho tem a função de estabelecer o vampiro como uma figura naquele universo, mas é muito fraco. É como um dos desenhos de intervalo comercial do Cartoon Network, só que ruim (isso até o vampiro aparecer novamente).
A molecada
Este é uma história de bullying e assombração. Como a guria foi chamada para ir com o grupinho, tendemos a supor que não há rusga alguma entre eles. Isso faz com que seja um choque a descoberta da brincadeira de mau gosto.
Essa revolta fortalece o valor que dou ao momento em que a guria se vinga. Só com isso o conto já é bom, mas há um lado sobrenatural bem empregado. A lenda do ônibus das crianças indesejadas é assustadora e foi aproveitada adequadamente com o conceito de Halloween e das abóboras protetoras.
No geral, é um segmento satisfatório. Funciona e cumpre o dever de um conto de terror, mas não faz nada muito inteligente.
A chapeuzinho vermelho
Este conto é bem interessante. Ele resgata o vampiro, faz uma tremenda quebra de expectativa com ele sendo a vítima e insere outro plot twist relacionado ao objetivo das personagens principais.
A história tem aquela ideia clichê do virgem que é empurrado pelos “amigos” e o espectador aceita essa motivação principalmente pela carga sexual que existe no conto. Quando a protagonista esclarece que a primeira vez que ela quer ter é em outro sentido, há uma quebra de expectativa.
A gente acha que o vampiro vai vitimar a chapeuzinho vermelho, mas ele acaba sendo comido pelo lobo. É um jogo temático bem bolado. Um ponto negativo é que o conto exagera na sexualização das personagens. Tem um certo contexto temático e narrativo, mas exagera.
Em dado momento, a irmã conta que a mãe delas dizia que a protagonista era a mais frágil da ninhada. A outra personagem reage como se não tivesse entendido, mas ela sabia sobre a natureza delas, então é meio contraditório.
Há detalhes que se perdem devido ao jeito que o filme picota essa história. No começo, quando as personagens estão se vestindo, uma delas fala como se homens e mulheres tivessem o mesmo sabor. Achei a frase estranha, mas ela é bem inteligente, considerando o plot twist.
Por outro lado, a inserção solitária do vampiro adiciona empolgação ao momento em que ele cruza com a chapeuzinho vermelho. Entre altos e baixos, é uma história acima da média de segmentos antológicos.
Slasher simplão
Este conto é bem tedioso. Ele não executa mal, mas é tempo demais sem elementos interessantes. O que tem de positivo é se ligar ao conto “pai e filho” e a revelação final acerca da identidade do protagonista, mas isso é muito pouco. A sacada do garoto abóbora se importar muito com aquele doce é o soco no estômago que garante meu veredito: ruim e chato.
Apesar de ter sido enfatizado o momento em que o abóbora o abriu, não me pareceu que o doce significava algo. Além disso, não o vi no ônibus escolar.
O final
De maneira bem bacana, o final de Contos do Dia das Bruxas mostra os personagens dos contos e repete a cena inicial, deixando claro que o menino abóbora foi o algoz do casal. Fechando com um toque de brilhantismo, o motorista do ônibus recebe uma visita das crianças afogadas.
É um desfecho redondo e pertinente para uma antologia que tenta tornar seu enredo relevante para além de cada conto. Não é tão bom quanto O Mal Está ao Seu Lado, mas acima da média das antologias. Gosto quando os filmes tentam ser mais surpreendentes e relevantes.
O conjunto da obra
Contos do Dia das Bruxas é uma coletânea de histórias medíocres que foram organizadas de um jeito que o todo supera a qualidade da soma das partes. Parabéns ao diretor, pois fez uma bela limonada.
Observação: as crianças-zumbis aparecem na cena inicial e na parte dos lobos há uma fantasia de cachorro-quente, então deve ser possível observar várias dessas pequenas referências do filme a ele mesmo. Deve caber uma análise minuciosa de cronologia para verificar se é coerente, mas é quase irrelevante para o todo. Fica como curiosidade.